quarta-feira, 23 de outubro de 2019

MEDITAÇÃO

Nada se move aqui. Não há ruídos. As cortinas cerradas deixam passar uma luz débil. Estará nublado? Melhor. Hoje preciso, como de pão, de um dia nublado. Esta avalancha de silêncio é insuportável. Melhor dizendo, desde há quarenta anos que tudo me comove. Uma única alegria cálida acaricia a minha mente, mas que bom saber que alguém teve tomates suficientes para não se vender.

Vitor Jorge

sexta-feira, 18 de outubro de 2019

AO REDOR DE MIM

AO REDOR DE MIM 

Esta gente toda que caminha comigo, ou está sentada às mesas dos cafés, nas esquinas e recantos, ou esses tipos que de repente se detém e olham para o vazio e depois continuam a caminhar e falam sozinhos e fazem gestos. O que será cada uma dessas vidas? Cada tipo caminha com o seu mundo de problemas, com as suas dívidas, as suas masturbações, os seus rancores, as suas nostalgias, as coisas que querem ser e essa pouca coisa que são. Penso e repenso, e ando sempre ao redor das milhares de imagens deste mundo quase indecifrável. Assim como eu giro ao redor da universalidade e creio que o mundo começa e acaba em mim, que tudo existe em função das minhas dúvidas, assim também cada um desses pobres diabos crê que o seu drama é o Grande Drama, quando na realidade a ninguém importa um chavo, assim na Terra como no Céu. Por fim, o carro. Que felizardo ele é. Todos os seus problemas são solucionados pelo mecânico. Mas quando a mim me falta um sentimento, um pistão, digamos, ou as minhas válvulas de escape estão gastas, ou a nostalgia, o sistema de ignição, digamos, tem a faísca atrasada, não há mecânico que possa concertar-me. O calor humano, a dignidade, operam milagres na incerteza cotidiana pela luta de um mundo mais igualitário e fraterno.

VitorJorge