O meu pai dizia-me frequentemente: Victor, acentuando foneticamente o "C" nome com que fui registado: nunca esqueças "só o teu trabalho te dignificará, luta sempre pelo bem de toda a humanidade mesmo que te pareça tarefa vã, estuda, faz de tudo, utiliza sempre o melhor em conformidade com os teus iguais, a tua maior riqueza nunca será a posse financeira ou imobiliária, mas a tua liberdade e a de todos, independentemente da cor ou credo com que se identifiquem, és universal". Tinha cinco anos, e cinco dificuldades de compreender aquela "lenga lenga" expressa ao final dos dias felizes como se fora oração. Era um credo, profundo, uma herança milionária que pretendeu legar-me em consciência e dignidade, únicos bens possuídos. Terá sido um bom pai?! Terei eu tido a capacidade de multiplicar a sua herança milionária?! Não sei! Deixo a resposta gravada a fogo nos meus actos ao longo da minha existência, que pode ter sido tudo, menos banal ou egocêntrica. Persistirei no meu trabalho e na sua dignidade até ao meu final, divertindo-me com a prática do bem, onde me reencontro e tenho um feedback feliz.
Hoje, constacto que essa transmissão de valores geracionais se perdeu num lapso de tempo, sem retrocesso, priveligiando-se a posse materializada evanescente indutora da fricção entre gerações.
O meu pai, na actualidade, seria classificado de "antiquado", e eu, que pratico o seu legado, de inconspícuo.
As preferências hodiernas incentivam e praticam um niilismo desenfreado numa prespectiva nefasta e ambígua de um desenvolvimento negativo do ser, na universalidade de valores progressistas, como a união entre os povos, paz honestidade, prática do ideal igualitário, as maiores posses que a natureza propõe como suporte de equilíbrio nesta corda que é a vida, nunca bamba, sempre firme e motivadora.
O pensamento é uma actividade linguística, uma vez que pensamos em palavras, queremos entender os sentimentos e transformá-los em palavras que provoquem o entendimento do que estamos sentindo.
Quando sentimos algo, estamos trabalhando com sentimentos, como se agíssemos com o coração. No entanto a cabeça quer participar do acontecimento e procura entender o que se está a passar. Mas a cabeça não entende sentimentos, pensa em palavras. Aí começa o desentendimento entre o coração e a cabeça, o desentendimento do eu comigo mesmo pode até gerar uma discussão interna, um desentendimento, uma insatisfação.
O conhecimento internalizado através da educação familiar, escolar, e do convívio social forma um outro eu dentro da gente: O eu que a gente acha que os outros acham que gente deve ser. Este outro eu, dentro de cada um, costuma discutir com o eu original que tem desejos nem sempre aceites ou aprovados.
Esse dinamismo é perfeitamente normal em todo mundo.
A busca da paz.
Entre os orientais é muito comum a meditação, processo que parte do diálogo interno, o eu mesmo com o outro eu, até que essa conversa acabe de vez, onde os dois “eus” internos se entendam, ou pelo menos diminuam o ritmo da discussão, passem a conversarem. É a busca do pensar em nada.
O meu pai pensava em nada, pensando em tudo na sua alma mater de todas as virtudes humanamente possíveis e impossíveis extraindo a riqueza que me transmitiu em legado de pobre.
Na contemporaneidade, os filhos valorizam a matéria dos progenitores ricos de quimeras fictícias.
Vítor Jorge
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